26 setembro 2016

40 anos após o crime em Barbados


Quarenta anos após a explosão de um avião civil cubano, perto da costa de Barbados, em 6 de outubro de 1976, que matou 73 pessoas inocentes, este hediondo ato terrorista ainda permanece impune, apesar das evidências esmagadoras que existem e que foram apresentadas contra seus autores materiais e intelectuais e seus cúmplices dos serviços de inteligência dos Estados Unidos.

O povo cubano, seu governo revolucionário e em particular os familiares das vítimas do crime de Barbados não têm descansado, durante todos estes anos, na luta pela justiça. A dor foi se transformando em força e coragem para dar a conhecer a verdade do caso, em todos os cenários, não só na Ilha, mas em muitos países ao redor do mundo. No entanto, a justiça esperada nunca apareceu.

Pelo contrário, os terroristas de origem cubana Orlando Bosch e Luis Posada Carriles, autores intelectuais confessos do crime abominável, foram protegidos pelo governo dos Estados Unidos, protegido sda justiça em seu território, onde receberam o total apoio da Agência Central de Inteligência (CIA), que os treinou desde o início dos anos 60, para cometer todo o tipo de atentados contra o povo de Cuba e sua Revolução.

A destruição no ar do avião da companhia aérea Cubana da Aviação, o voo CU-455 que cobria a rota Guiana-Trinidad e Tobago-Barbados-Jamaica e, finalmente, Havana, foi um fato chocante, nunca acontecera um fato semelhante no hemisfério Ocidental. A maquinação para planejar o assassinato de pessoas inocentes, com o amparo do governo venezuelano, liderado então por Carlos Andres Perez, e o consentimento da CIA, revela a verdadeira essência criminal de todos aqueles que estiveram envolvidos no crime.

Talvez as novas gerações não saibam completamente como era articulado o mal contra Cuba, nesses anos, em que milhares de cubanos morreram como resultado de atos de terrorismo encorajados e financiados por sucessivas administrações norte-americanas, para destruir a Revolução Cubana.

Agora, quando se completam 40 anos do atentado ao avião cubano em Barbados, temos o dever de resgatar a memória daqueles eventos que nunca devem ser repetidos.

NADA É FICÇÃO
Eu lembrava que há um par de anos atrás, no final de uma conversa com um grupo de estudantes do ensino médio, aproximou-se de mim um menino com olhos vivos e me perguntou, muito curioso, se o spot televisivo em que se escuta a voz do có-piloto do avião cubano antes de cair no mar, era uma recriação daquele momento dramático.

Fiquei surpresa e lhe pedi para me explicar por que ele pensava assim, enquanto lhe explicava que aquele grito lancinante (“Isso é pior, Felo, é melhor ficar perto da água”!) era tão autêntico que expressava a grande humanidade daqueles homens que, até o último momento, tentaram impedir que o avião caísse no mar.

Aquele jovem não tinha uma ideia clara sobre essa tragédia que trouxe o luto para muitas famílias em Cuba, Guiana e a República Popular da Coreia. Ele acreditava que a imagem do navio caindo fora da costa de Barbados era ficção. Tal como ele, ainda eu não sei quantos permanecem inconscientes ou confusos sobre este triste episódio na história de agressão contra a Ilha.

OLHANDO NOS OLHOS DOS TERRORISTAS
Alguns leitores vão lembrar que eu fui a jornalista venezuelana que denunciou os terroristas Orlando Bosch, Luis Posada Carriles, Hernan Ricardo e Freddy Lugo, por seu envolvimento direto no atentado ao avião da Cubana da Aviação.

Só por coincidências da vida eu visitei na prisão do quartel San Carlos, de Caracas, Freddy Lugo, um fotógrafo, colega de trabalho da revista Páginas, que foi preso por seu suposto envolvimento no atentado do avião cubano. Eu não acreditava que ele e o outro fotógrafo do jornal El Mundo, Hernán Ricardo, estivessem envolvidos em um crime tão horrível.

Muito antes que Lugo e Ricardo colocassem os explosivos no avião da Cubana já faziam parte da minha vida profissional, eu conhecia eles como rapazes trabalhadores; um pouco mais Freddy Lugo, com quem frequentemente saía para fazer reportagens para a revista Páginas.

Através de Lugo surgiram as relações com outros terroristas, prisioneiros também no quartel San Carlos, enquanto se desenvolvia no tribunal o processo que, durante as minhas visitas à prisão, vim descobrir que era completamente arranjado, com a permissão do presidente Carlos Andrés Perez e depois que este concluiu seu mandato, com o apoio do presidente Luis Herrera Campins e a Polícia Política (Disip), da qual Posada Carriles tinha sido comissário.

Freddy Lugo estava na mesma cela com um dos contrarrevolucionários mais notórios de origem cubana, Orlando Bosch, quem era uma sorte de herói para ele, a quem sempre exortava a que me contasse suas histórias de “lutador pela democracia em Cuba”. Bosch desfrutava, esfregando-se as mãos, e contava com detalhes seus atos terroristas. Dessa maneira, cheguei à conclusão de que se esse homem tinha esse registro criminal e era um prisioneiro, provavelmente poderia estar envolvido na sabotagem do DC-8 da Cubana da Aviação.

Eu me sentia muito tensa quando estava na frente daquele homem, de olhar interrogador, atrás de alguns óculos de lentes grossas, o qual insistia em me dar até mesmo os menores detalhes de como colocar bombas em embaixadas e consulados cubanos no exterior, bem como em escritórios da Cubana de Aviação e em outros dedicados ao turismo com a Ilha.

Esses foram momentos muito fortes, difíceis de lidar, com uma carga de surpresa e de raiva, de medo... porque realmente, eu sentia medo, minhas pernas tremiam, mas tentava manter a compostura quase sem proferir palavras, não era necessário. Bosch tomava posse do palco, gesticulando com suas mãos, às vezes se erguia do assento e contava com sua voz estridente suas façanhas, como se na frente tivesse um público cativo.

Então, eu determinei fazer uma investigação jornalística sobre o caso de um avião cubano com duas fontes primárias: Bosch e Lugo.

ELES ME DISSERAM TUDO
Durante mais de dois anos visitei estes terroristas no quartel de San Carlos. Lá eu conheci a mulher de Bosch, a chilena Adriana Delgado, e Nieves de Posada, esposa de Posada Carriles. Com elas duas mantive relações próximas, sempre nos juntávamos durante as visitas e elas contribuíram com bons dados para o trabalho jornalístico que eu estava preparando.

As duas, imprudentes e faladoras, confirmaram tudo o que Bosch contava acerca dos seus esforços “para libertar o país martirizado”, juntamente com Posada Carriles. Nieves, uma fonte indireta mas muito valiosa, vangloriava-se de que o marido tinha conseguido treinar-se na CIA e era um perito em explosivos.

Esta mulher foi chave para saber como Posada Carriles planejou junto com Orlando Bosch, o atentado ao avião da Cubana, bem como outras ações criminosas dos grupos contrarrevolucionários cubanos, incluindo o assassinato do ex-chanceler chileno Orlando Letelier e sua secretária Ronni Moffit, em Washington, três meses antes da explosão, em pleno ar, do avião em Barbados.

Disseram-me tudo. Lugo me contou, passo a passo, como eles colocaram a bomba no banheiro localizado na parte traseira do avião. Em um ataque de raiva, Bush disse na minha presença que tinha explodido um avião carregado de comunistas. Posada, de acordo com documentos tornados públicos pelo FBI, anunciou que “vamos fazer explodir um avião cubano” e Ricardo, descaradamente, gritou para todo mundo ouvir, no pátio de exercícios do quartel San Carlos: “Pusemos a bomba, e daí?”.

O GRITO NO TÍTULO DO LIVRO
De uma forma muito geral, lembrei-me de episódios nesse momento que mudou minha vida para sempre. Já sabendo muito bem que esses homens eram os assassinos de 73 pessoas inocentes, que viajavam a bordo do voo CU-455 da Cubana, tive em minha vida que adotar uma decisão determinante; ou os denunciava ou ficava calada e eu, automaticamente, tornava-me cúmplice deles. Optei pela denúncia e tive que fazê-la fora do meu país para proteger a minha vida dos assassinos do governo social-cristão de Luis Herrera Campins.

Em setembro de 1980, sabendo que um tribunal militar tinha absolvido os quatro terroristas, alegando que “foram destruídas as provas” que serviam de base à acusação; convoquei uma entrevista coletiva, com a mídia nacional e estrangeira, na Cidade do México e denunciei os responsáveis ​​pelo atentado à aeronave acidentada: Eu disse tudo o que eles me disseram sobre seu planejamento e execução e a cumplicidade dos governos de Carlos Andres Perez e de Luis Herrera Campins.

Também, eu me referi a uma série de atos terroristas cometidos em outros países por Bosch e Posada Carriles, com saldo de morte e destruição e, especialmente, alertei a comunidade internacional sobre a intenção desses criminosos de continuar essas ações destrutivas contra Cuba e seu povo.

Posteriormente, essa denúncia foi ampliada em meu livro que escrevi e intitulei Pusemos a bomba... e daí?, título tirado do grito de Hernán Ricardo, autor, junto com Freddy Lugo, deste crime abominável.

Vinte e cinco anos após a publicação da minha investigação jornalística, foi lançada uma nova edição alargada do livro, que inclui documentos revelados pela CIA e o FBI sobre a sabotagem do avião cubano, que corroboram que os fatos ocorreram tal e como eu os denunciei, desmontando, dessa forma, a campanha de mídia da direita que espalhava em seus meios de comunicação que era uma história artificial para favorecer a Revolução cubana.

Alicia Herrera, jornalista venezuelana e lutadora contra o terrorismo

Do Granma

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