Páginas

16 dezembro 2018

Carta aberta de Lula ao Povo Cubano



Queridos amigos de Cuba

A saúde não é um bem, não é propriedade privada. Saúde é vida, a primeira condição para poder fazer qualquer coisa neste mundo. Os serviços de saúde não podem ser tratados como qualquer negócio. O ofício de quem cuida da saúde dos outros sempre será um dos mais belos, será sempre uma missão, um ato de generosidade e afeto pelos outros.
 
No Brasil, os médicos cubanos chegaram a lugares onde não havia médicos brasileiros. Para muitas comunidades pobres e distantes, algumas delas indígenas, que nunca foram atendidas por um profissional de saúde.

Muitos criticaram o governo da presidente Dilma Rousseff por trazê-los. Como seria bom poder passar sem eles! Que o Brasil tivesse médicos suficientes com quem todas as praças do interior e as periferias pobres do Brasil poderiam ser cobertas. Quão bom seria se tivéssemos, como Cuba, médicos suficientes para exportar para outros países! É muito bom ver como uma ilha latino-americana exporta médicos em todo o mundo. Muito melhor do que os países ricos, que exportam soldados, lançam bombas em comunidades pobres. Cuba, por sua vez, exporta vida, amor e saúde.

Acontece que não temos tantos médicos. O Brasil foi o último país da América do Sul a ter uma universidade, inaugurada em 1922. E foi porque tiveram que criá-la para conceder o título de Doutor ao Rei da Bélgica! Brasil e Cuba viveram séculos de escravidão e exploração colonial. Mas dos dois, apenas Cuba tem médicos suficientes para exportar para o mundo.

Antes do Partido dos Trabalhadores tomar o poder, no Brasil a medicina era uma carreira exclusiva para o filho dos ricos. Antes de o PT chegar ao poder, o filho do pobre homem não tinha sequer o direito de sonhar em se tornar médico. Criamos cotas para negros e estudantes de escolas públicas em universidades federais, estendemos os mecanismos para que os jovens pudessem estudar gratuitamente em escolas particulares ou, ao invés disso, pagar juros baixos assim que terminassem seus estudos. Abrimos novas universidades, incluindo cursos de medicina, no interior do país. Aumentamos a matrícula de jovens pobres e negros no ensino superior. Quando o golpe de Estado para a democracia ocorreu em 2016, com o objetivo de retirar o PT do governo, uma das primeiras medidas adotadas foi impedir a criação de novos cursos de medicina no país. Proibir a formação de mais profissionais de saúde. Um absurdo!

Mas o governo de Michel Temer, a pedido dos prefeitos das cidades, ciente de como era difícil encontrar médicos para as unidades de saúde, manteve o programa Más Médicos de 2016 até 2018.

Quando os médicos cubanos chegaram ao Brasil, tentaram desacreditá-los de qualquer forma. Mas eles venceram pela qualidade do serviço prestado ao povo brasileiro. Por sua dedicação, por cuidados médicos, por seu conhecimento e profissionalismo, pela medicina humana e preventiva que colocam em prática. Eles ganharam o carinho e a gratidão de milhões de brasileiros que agora temem perder novamente os cuidados médicos que salvaram tantas vidas no Brasil.

Lamento que o preconceito do novo governo contra os cubanos tenha sido mais importante que a saúde dos brasileiros que vivem nas comunidades mais distantes e carentes.

Agradeço aos médicos cubanos que souberam superar as críticas e preconceitos e nos ensinaram que uma medicina mais humana não só é possível, como também é mais eficiente para melhorar os indicadores de saúde de nossas comunidades. Finalmente, os médicos trocaram experiências e conhecimentos com muitos médicos brasileiros e alertaram a todos sobre a importância da medicina preventiva e da atenção médica às famílias.

É por isso que quero expressar ao povo cubano: que eles podem se sentir muito orgulhosos de seus médicos e de suas faculdades de medicina. No Brasil, você conquistou milhões de admiradores, a gratidão de milhões de pessoas.

O distrito de Batinga, na cidade de Itanhém na Bahia, organizou uma marcha com a participação de toda a comunidade para se despedir de Dr. Ramon Reyes, que durante anos lhe deu atenção médica e foi capaz de ganhar a simpatia de todos. Eles saíram com cartazes em que agradeceram todas as coisas boas que o médico fez e estavam esperançosos de que ele voltaria um dia. Um simples e sincero tributo de pessoas que receberam o cuidado atento a partir de uma ilha caribenha distante durante décadas cercadas por um bloqueio feroz imposta pelo país mais poderoso da terra, e que ainda consegue exportar médicos e conhecimento.

Os laços de fraternidade existentes entre os povos são mais fortes do que o ódio irracional de alguns representantes da elite.

É a lição dada pelos médicos cubanos em tantos países do mundo e também aqui no Brasil.

Muito obrigado

Luis Inácio Lula da Silva

Nenhum comentário:

Postar um comentário